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Torta Napoleão, patrimônio cultural de Piraju!

Recria tua vida, sempre, sempre.
Remove pedras e planta roseiras e faz doces. Recomeça.

Cora Coralina
 

Por um mágico instante, vou me desnudar totalmente da chata, mas apaixonante vestimenta de ecologista da prosperidade, para registrar uma história construída unicamente em Piraju por minha família. Uma homenagem, ainda que tardia, à minha avó Anita (in memorian) e à minha mãe Isair.

A comida une as pessoas à mesa, lugar onde mais as famílias se encontram para passar horas agradáveis, principalmente em comunidades pequenas.  De tempos em tempos ocorria em Piraju uma festa na sede da loja maçônica, em face do batizado dos filhos de maçons. Nessas ocasiões mulheres e crianças podiam adentrar naquele secreto e misterioso local. Era hábito corrente no seio das famílias maçons levar farturas de comes e bebes para comemorar tão festiva data.

Nos idos de 1955, Anita Longo Vecchia (1905-1976) foi convidada por seu filho maçom Roberto Vecchia (1921-1989) para participar da festa de batizado de meus irmãos José Roberto e Ronaldo Vecchia.

Nesse evento, dentre muitos quitutes, um em especial chamou a atenção de Anita. Um pequeno doce com cerca de três centímetros quadrados, parecido com um petit-four, aquelas deliciosas e delicadas iguarias francesas. Era composto por camadas de massa, separadas por generosas camadas de creme e chamado de Napoleão, provavelmente uma homenagem ao imperador francês.

O Imperador Napoleão Bonaparte, um líder à frente de seu tempo, tem uma passagem curiosa em relação à gastronomia. Não era um apreciador da boa comida francesa. Reza a história que, quando em combate, supervisionava pessoalmente a preparação da comida e alimentava-se junto com sua tropa, rapidamente e de pé.

Bonaparte é considerado o primeiro líder militar a se preocupar com a qualidade alimentar de seus comandados. Percebeu que podia conquistar as pessoas pela boca e sabia como ninguém agradar a nobreza, ao exigir pratos esteticamente bonitos em fabulosos almoços e jantares. Assim se deu a valorização da gastronomia francesa, sendo Paris a capital mundial da gastronomia.

O doce Napoleão lembrava a sobremesa francesa mil folhas, ou mille-feuille, composta por massas folheadas e creme, deveras popular na França. A massa folheada é muito utilizada tanto na cozinha francesa como na italiana, em uma infinidade de recheios e coberturas doces ou salgadas. Acredita-se que tenha origem húngara, mas são os franceses os detentores dos créditos de sua criação.

Com seu veio empreendedor, Anita já havia conquistado os pirajuenses pelo paladar por meio de suas já tradicionais receitas, tais como: cabeça alemã, torta de amendoim, quindim, mantecau, bolos, massas, coxinha de frango, entre tantas outras delicias. Mas foi além e transformou aquele pequeno doce em uma apetitosa torta. Acrescentou alguns ingredientes, principalmente uma cobertura de chocolate do padre com chocolate granulado e pronto. Estava criada em Piraju, em meados da década de 1950, a Torta Napoleão!

Dona Anita sempre em parceria com sua nora Isair Rocha Vecchia (1923-), a “dona Zaira”, atendiam à crescente demanda local, pois rapidamente a torta caiu no gosto dos pirajuenses e passou a ser o carro chefe dessa cozinha informal.

Alguns anos mais tarde, com a passagem de Anita, dona Zaira fez pequenas modificações na receita original. Substituiu a cobertura de chocolate do padre e chocolate granulado por chocolate amargo (ganache), e mais alguns outros pequenos segredos culinários. Dentro de sua extrema generosidade, passou a ensinar sua arte culinária a muitos pirajuenses.

Atualmente há muitas versões da torta, mas a original, oriunda da sabedoria e perspicácia de dona Anita e dona Zaira é a receita postada a seguir. Usem, abusem e se lambuzem. De Piraju para o mundo e para a eternidade do domínio público.

Torta Napoleão é 100 % coisa nossa, é 100 % de Piraju! Um patrimônio cultural de nosso povo, que merece esse registro para a posteridade. Salve, salve dona Anita e dona Zaira!

RECEITA DA TORTA NAPOLEÃO

  1. Ingredientes:

  Massa:

  • Meio quilo de farinha de trigo
  • 2 gemas de ovos
  • 3 colheres de sopa de açúcar
  • 2 xícaras de café de óleo
  • 3 colheres de chá de fermento Royal
  • 1 pitada de sal

 Recheio:

  • 5 gemas de ovos
  • 100 gramas de manteiga sem sal
  • 1 litro e meio de leite integral
  • 4 copos de açúcar
  • 3 colheres de sopa de farinha de trigo
  • 3 colheres de sopa de maisena
  • 1 colher de chá de essência de baunilha

 

  Cobertura:

  • 1 barra de 170 gramas de chocolate meio amargo (ganache)
  • Meia lata de creme de leite, sem soro

 

  1. Modo de Fazer:

 

Massa:

  • Misturar os ingredientes da massa com um pouco de água, amassar e deixar descansar por meia hora.
  • Abrir a massa bem fina do tamanho da assadeira que for utilizar para assar.
  • Assar uma a uma as lâminas de massa em fogo alto e reservar

Recheio:

  • Misturar todos os ingredientes do recheio.
  • Bater muito bem na batedeira até que fique bem cremoso.
  • Levar ao fogo para cozinhar, mexendo sem parar até completar o cozimento.
  • Deixar esfriar um pouco.
  • Ainda morno, aplicar o recheio sobre a massa em camadas alternadas e proporcionais.
  • Levar à geladeira por três horas.

 

Cobertura:

  • Derreter a barra de chocolate em banho maria, sem deixar ferver a água.
  • Acrescentar o creme de leite e misturar bem.
  • Aplicar imediatamente cobrindo toda a Torta
  • Levar à geladeira.

                                                          Isair Rocha Vecchia